Pedro Campos e os números: uma serena história de amor
Em uma de suas crônicas mais famosas, o escritor mineiro Paulo Mendes Campos diz que o amor acaba sem muito alarde. Assim como o fim, o início das histórias amorosas também pode ser sereno. Prestes a se tornar doutor em matemática pelo IMPA, Pedro Campos, conterrâneo (e não parente) do autor, não se apaixonou pela disciplina à primeira vista. Pendendo também para a ciência da computação e a engenharia mecânica, ele escolheu a graduação em matemática “por exclusão”. “Talvez seja mais romântico dizer que eu tenha visto na matemática algo prazeroso e permanecido nela por uma década”, brinca.
Nesta sexta-feira (19), às 14h, Campos defende a tese “Resultados extremais em estruturas aleatórias e pseudo-aleatórias”, por videoconferência. A apresentação será transmitida no YouTube do instituto. Orientado por Robert Morris, o trabalho tem como tema os grafos, objetos matemáticos que modelam relações entre pessoas ou coisas. Trata-se de uma área relativamente nova na matemática, que atrai, cada vez mais, o interesse de pesquisadores mundo afora.
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“Podemos imaginar, e até desenhar, um grafo da relação de amizade entre as pessoas. Eu, particularmente, estudo os chamados grafos aleatórios. Imagina como se no início do universo, alguém tivesse decidido, pelo jogar de uma moeda, quem seria amigo de quem na vida. Aí já vira um problema de probabilidade também. O que se esperar de um grafo típico definido por caras ou coroas?”, explica o doutorando.
Nascido em Belo Horizonte (MG), Campos passou a vida inteira em Contagem, município da Região Metropolitana da capital mineira. Via os pais, ambos com diploma de curso superior, como exemplos a serem seguidos. “Era extremamente calmo e obediente. Fui consistentemente um aluno que fez todos deveres de casa até os 16 anos”, lembra.
Ao longo dos anos, sua preferência não tendia para nenhuma matéria em particular. “Bom mesmo, na escola, era brincar. Mas aparentemente isso não era uma matéria”, ri. As horas que passava montando estruturas com Lego, no entanto, levaram seu pai a intuir que seria engenheiro. Previsão que, de fato, “quase colou”, diz.
Com a chegada da adolescência, surgiu a predileção pela área de exatas. Ingressou na graduação em ciência da computação na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mas achou o ritmo “muito intenso”. Depois, migrou para engenharia mecânica na mesma universidade, onde se deparou com “muita informação jogada sem explicações.”
Deu-se por satisfeito na faculdade de matemática da instituição mineira, onde os conteúdos eram “ensinados do zero”. “Encontrei um conhecimento que precisa de muito tempo e paciência para se aprender. No curso você aprende tudo, desde soma e subtração até tópicos relativamente recentes da pesquisa matemática”, relata.
Deslumbrando com as novidades do ambiente universitário, Campos confessa que, durante um período do curso, fez o “mínimo necessário”. No âmbito pessoal, no entanto, considera que viveu uma experiência incrível. “É difícil não sair da sua própria bolha pessoal quando tem tanta coisa interessante acontecendo.”
Já no mestrado no IMPA, onde ingressou em 2014, os estudos dominaram sua vida. “É difícil balancear a pressão que a gente coloca na gente mesmo quando surge uma oportunidade que parece boa”, diz. O esforço durante a pesquisa foi tamanho, que o matemático considerou não seguir com a formação acadêmica.
Uma vez no doutorado, decidiu fazer diferente. “Comecei por não me pressionar a terminar. Em certa medida, está tudo certo se as coisas derem errado. Por aceitar essa premissa, sinto que percorri o doutorado de maneira mais saudável. Também sinto que esse cuidado que tive comigo mesmo refletiu na minha pesquisa, pela qual tenho um certo carinho.”
A atração pelos grafos aleatórios se dá, em parte, pelo frescor do tema. “Existe uma certa simplicidade na estética de como ela é feita. Mas há também uma falta de bagagem técnica para lidar com os problemas. A mim parece que as ferramentas da área estão sendo construídas agora, e muito rapidamente.”
A descontração do seu orientador Robert Morris, conhecido por frequentar as conferências da comunidade de combinatória de chinelo, foi fundamental para que o doutorando encarasse a empreitada com mais leveza. “Foi exatamente o orientador que eu precisei. Em um ambiente tão exigente, tive o alívio de pressão que buscava. Ele é um ótimo pesquisador. E me deixou livre pra aprender e pesquisar o que eu quisesse, além de criar um ambiente favorável para que isso acontecesse”, conta.
“Se ele não tivesse deixado a Inglaterra para se aventurar pelas nossas terras, eu provavelmente não estaria fazendo matemática hoje”, imagina Campos, que já deu início ao pós-doutorado na Czech Academy of Sciences, que deve ter duração de dois anos.
Nesta reta final da defesa da tese, para aliviar o estresse provocado pela pandemia, o matemático passou a se aventurar em diferentes atividades, como a yoga, o violão, o estudo de teoria musical e a escrita criativa. “Queria descobrir se o pensamento matemático que se desenvolveu em mim pode ser transferido para algo completamente diferente. Ou talvez a pesquisa me atraia por mais um tempo. Só o destino que sabe.”
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