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07/12/2020

Pandemia alavanca novos formatos na cena teatral

Atrizes do The Tempest com equipamentos de realidade virtual durante experimento no IMPA

Diante das limitações trazidas pela quarentena, a cena cultural sofreu sérias intervenções e está tendo que se reinventar. No caso do teatro, a possibilidade de adaptar as peças para produções caseiras abriu horizontes para um formato híbrido, que tem a tecnologia como aliada. Dirigida por Cássia Vilasbôas, a peça “Lá fora, temporal” foi transmitida por uma plataforma de streaming em forma de “cine teatro”. O público pôde interagir com as quatro câmeras que mostravam a encenação, escolhendo os ângulos que desejam assistir.

As inovações trazidas por essa e outras peças elaboradas na pandemia, como a remontagem do clássico de Nelson Rodrigues “Anjo negro”, de Antonio Quinet; e “Histórias de confinamento”, da companhia mineira Grupo Galpão, apontam para um futuro do entretenimento que o Visgraf (Laboratório de Computação Gráfica do IMPA) já vislumbra há algum tempo. Com projetos que estão na fronteira da tecnologia, o grupo vem aprimorando o VR Kino+Theater, um software que integra formas tradicionais do teatro e cinema, por exemplo, com tecnologias avançadas.

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Com uma equipe interdisciplinar formada por profissionais de artes cênicas, designers e cientistas da computação, eles apresentaram ao público, em 2018, o The Tempest, experimento baseado na peça de Shakespeare que combina performance teatral, cinema ao vivo, realidade virtual e tecnologia de jogos através do VR Kino+Theather. No espetáculo, exibido algumas vezes no IMPA, os atores ficaram totalmente imersos em um cenário virtual e a performance ao vivo foi exibida ao público em uma tela de cinema com computação gráfica em tempo real sob o controle interativo do diretor.

Para Luiz Velho, pesquisador-líder do Visgraf, a adoção de novas tecnologias e formatos por companhias de teatro tradicionais, acentuado pelo momento de isolamento social, aponta que a pesquisa desenvolvida no Visgraf está “no caminho certo”. “Isso mostra que a pesquisa, quando é bem feita, antecipa movimentos da sociedade que chegam mesmo. Já havia uma tendência latente de uma adoção maior a novas mídias, mas as pessoas ainda estavam acostumadas ao tradicional. A pandemia exacerbou isso. A mídia do futuro já está acontecendo e nós estamos ajudando a construir, aproveitando esta aceleração da pandemia para potencializar ela.”

O aumento da interação do público com a obra através da escolha da câmera e o conceito de “cinema ao vivo” são alguns dos componentes das novas produções teatrais que já vinham sendo explorados pelo laboratório do IMPA, elenca Velho. “Nas experimentações  do Tempest, o diretor de cinema é como um DJ. Ele cria controles para alguns estilos de planos, e implementa isso na hora da apresentação com ajuda da programação inteligente. Em menor escala, é semelhante com o que está sendo feito agora nas montagens de cine teatro, mas as produções não têm recursos para usar uma tecnologia avançada.”

E o Visgraf tem trabalhado para entregar essas ferramentas à sociedade. “No laboratório usamos câmeras caras de capturas de gestos e movimentos. Estamos desenvolvendo um programa mais acessível. Bastaria uma webcam e um computador razoável para que o diretor fizesse essa captura. Acreditamos que em dois anos as novas tecnologias já devem estar bem mais disseminadas”, conta o pesquisador.

A mudança de formatos no entretenimento alavancada pela tecnologia é um frescor para o público, que passa a interagir de forma mais ativa com a obra e um desafio para os criadores, que terão que desenvolver uma nova linguagem. “Vamos ter espetáculos que acontecem em tempos diferentes, no qual cada pessoa participa à sua maneira. Quem concebe o espetáculo monta um ambiente propício a isso. O espectador pode em um momento assistir passivamente, observando uma ação e descobrindo coisas novas, e em outro interferir na ação.”

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