Navegar

24/11/2020

Conectada, Natália inicia a faculdade de matemática

Nos últimos dias, a casa da família de Natália Brito Lopes, na zona rural de Cocal dos Alves (PI), ganhou um importante e inédito aparato. Com parte da bolsa de R$ 400 que recebe por ter ingressado na universidade através do Programa de Iniciação Científica e Mestrado (PICME), a medalhista de prata da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) em 2018 e, agora, futura matemática conseguiu garantir um ponto de acesso à internet na casa dos pais. Por conta da pandemia do coronavírus, é de lá que ela dá os primeiros passos na graduação, assistindo as aulas virtuais da Universidade Federal da Parnaíba (UFDPar), também no Piauí. No ano passado, Natália foi entrevistada pelo Fantástico (TV Globo) para contar sobre a ameaça de corte no auxílio financeiro do CNPq. A matéria que levantou uma corrente de solidariedade foi a segunda colocada no Prêmio IMPA-SBM de Jornalismo 2020

Da exibição da reportagem “Medalhistas da Olimpíada de Matemática temem futuro dos estudos com corte da bolsa” até hoje, a vida da estudante mudou bastante. “Essa matéria foi decisiva. Na época, recebia os R$ 100 mensais pelo PICJr e já tinha planos de fazer o ENEM, mas não seria possível entrar na universidade e me mudar de cidade se não houvesse a renovação da bolsa. Meus pais não tinham como me ajudar, então ficaram muito apreensivos”, revela. Com a manutenção do auxílio, ela pôde realizar o sonho de ser a primeira integrante da família a cursar a graduação. 

Leia mais: Segunda live do INCTMat vai tratar da avaliação de projetos
Curiosidade é motivação comum entre jornalistas e cientistas
Em live sobre simetria, Marcelo Viana fala do Teorema Mágico

Não fosse o período do isolamento social, Natália estaria hoje no apartamento onde divide um quarto com cinco colegas que também estão na Universidade Federal da Parnaíba (PI). Mudar-se para outra cidade foi uma decisão matemática para não pesar o orçamento da família. “De Cocal até Parnaíba são duas horas de viagem. A passagem para ir e voltar sairia R$ 50 por dia, R$ 250 por semana. Alugar e dividir o apartamento com outros universitários sai bem mais em conta.” Com o restante da bolsa, a jovem ainda consegue ajudar os pais e os três irmãos mais novos nas compras do mês. 

Natália sonha em ser professora de matemática e já dá os primeiros passos na Universidade Federal da Parnaíba

Apesar de ter ido presencialmente à faculdade por apenas 15 dias, a graduanda se diz encantada pelo espaço que reúne uma multiplicidade de saberes e pessoas que compartilham diferentes culturas. “Quando digo que curso matemática, tem muitas pessoas que falam: ‘matemática? Tem certeza? É tão difícil, meu Deus..’ ou ainda ‘mas você quer mesmo ser professora?’ Não tenho dúvidas. É o caminho que quero seguir”, revela a jovem de 18 anos. 

A inspiração para o caminho matemático começou com o primeiro professor que Natália teve, ainda nos anos iniciais do Ensino Fundamental, Júnior Machado, e se estendeu às aulas dos professores Amaral e Raimundo Brito no Ensino Médio da Escola Estadual Augustinho Brandão. Para ela, o encanto da ciência está na liberdade de se percorrer vários caminhos ao fazer contas e sempre chegar em um resultado. “É uma mistura que envolve mistério e solução”, classifica. 

A futura matemática, que já se viu envolvida por uma corrente de apoio com pessoas de todo o Brasil, sabe bem o significado da palavra solidariedade. “Acredito que é quando nós não pensamos só em nós. Pensamos também no outro. Sei que batalhamos para termos nossas coisas, mas sempre podemos ajudar.” E pretende dar continuidade a essa força do bem que fez com que ela não desistisse dos seus objetivos. “Um dos meus maiores sonhos é conseguir um emprego fixo e ajudar outras pessoas, criar projetos voltados para crianças que não tenham o acesso à educação.” 

Leia também: Na Folha, o maior matemático do Ocidente islâmico
Mistério dos buracos negros fica em 1º lugar no Prêmio IMPA-SBM