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18/03/2022

NFTs inflam debate sobre propriedades digitais e arte

Imagem: Galeria virtual do pesquisador do IMPA Luiz Velho

Ana Luísa Vasconcellos

O crescente fascínio de grandes celebridades e entusiastas da arte e tecnologia pelos “Non-fungible Tokens”, conhecidos como NTFs, vem chamando a atenção para um novo mercado que movimenta milhões. Em um processo de digitalização acelerado, o token não-fungível, tradução em português para a sigla NFT, surgiu como uma representação de propriedade exclusiva. No universo das criptomoedas, um token é a representação digital de um ativo registrado em uma blockchain, sistema que permite rastrear o envio e recebimento de informações pela internet e requer bastante matemática. Mas, será que isso é suficiente para atestar a segurança e credibilidade dos NFTs?

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Segundo o pesquisador do IMPA Augusto Teixeira, especialista em probabilidade e entusiasta do sistema blockchain, ainda é cedo para fazer afirmações certeiras sobre os NFTs. Teixeira também é diretor científico do CARTESI, plataforma para o desenvolvimento e implantação de aplicativos descentralizados compostos por blockchain e off-chain.

“A maioria dos NFTs são basicamente ‘carimbos’ atestando que, por exemplo, uma foto pertence a certa pessoa, só que todo mundo pode acessar essa imagem. Mas é difícil dizer que isso não tem valor atribuído, porque os colecionadores vivem disso. O artista digital costuma ter uma limitação de não conseguir endossar uma propriedade digital única e, com o NFT, ele pode. Se isso vale alguma coisa ou não é o mercado que vai dizer”, afirma.

Imagem: Galeria virtual do pesquisador do IMPA Luiz Velho

As transações envolvendo NFTs são feitas usando o sistema blockchain, que funciona como um livro digital de registros contábeis. A tecnologia por trás disso tem criptografia integrada, uma forma de validar registros de arquivos com segurança nas transações digitais. É esta intrincada codificação que permite confiabilidade no universo das criptomoedas.

Sistema blockchain

Fundamental para o blockchain, a matemática está presente desde a concepção do sistema, que funciona a partir de um servidor mantido por rede descentralizada. Esse formato impede a existência de um agente central nas decisões e, para qualquer execução, é necessário que todos os agentes aprovem a ação. “A matemática está presente de várias formas, desde questões mais simples como o porquê dessa votação funcionar por maioria até mais complexas como a criptografia por trás disso, o uso da assinatura digital, entre outros assuntos”, explica Teixeira.

Apesar de operarem no mesmo sistema, ainda há diferença entre a credibilidade e segurança de um NFT e das criptomoedas. “A criptomoeda tem um objetivo mais claro para o futuro e, se chegarmos nesse plano futuro, será um sistema de muito valor. O projeto mais amplo das criptomoedas é interessante, mas não sabemos se vai se concretizar. E, mesmo que você acredite que vai se concretizar, ainda precisa confiar que é algo que não será completamente instável”, explica Teixeira.

Já os NFTs, muitas vezes, não operam no sistema idealizado pelos criadores e são ainda mais imprevisíveis, destaca o pesquisador. “Inicialmente, a ideia era disponibilizar o arquivo no blockchain, mas rapidamente percebeu-se que seria impossível, porque era muito caro. Então, surgiu a ideia de que só a assinatura do objeto, mais leve, ficaria no sistema. Atualmente, o que as empresas fazem é mais perigoso e rudimentar do que isso. Elas hospedam um link com informações sobre o NFT na blockchain. Então, se derrubarem o link, a informação se perde”, comentou.

Debate no mundo artístico

A prática de compra e venda de NFTs não causa polêmica somente por causa da credibilidade do registro, mas também gera debates acalorados no mundo da arte. Por um lado, esse sistema permite que artistas – dos mais famosos aos anônimos – possuam um canal de venda direto com o consumidor de arte, garantindo que mesmo que uma obra digital seja amplamente compartilhada, ela tenha seu valor garantido a partir de uma propriedade única. Por outro lado, há espaço para fraudes e plágio.

Além disso, a novidade causou uma confusão entre consumidores que ainda não entendem o que o direito de propriedade significa. “Os NFTs partem do princípio de criar um certificado digital que ateste o pertencimento a alguém. O problema é que ainda não existe um conjunto de regras e leis que dão suporte legal ao NFT, o que pode criar um conflito entre o direito de propriedade e o direito autoral, por exemplo”, opina Teixeira.

Pesquisador-líder do Visgraf criou metaverso onde expõe suas fotografias

Para testar o funcionamento dos NFTs, o pesquisador-líder do Visgraf (Laboratório de Computação Gráfica do IMPA), Luiz Velho, teve a ideia de reunir fotografias antigas e exibi-las e comercializá-las em uma galeria virtual no metaverso. O ambiente foi criado na plataforma Spacial e proporciona aos usuários uma experiência imersiva, com direito à aquisição das obras. A curadoria contém quatro coleções de fotos analógicas que datam das décadas de 70 e 80, de autoria do pesquisador.

“Atualmente os NFTs estão sendo movidos por muito modismo, mas em algum momento essa moda vai passar e vão sobrar inovações importantes. Do mesmo jeito que você pode comprar músicas ou filmes na internet para assistir, no futuro pode ser corriqueiro comprar um NFT”, comenta.

Imagem: Galeria virtual do pesquisador do IMPA Luiz Velho

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