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02/08/2021

Colóquio ajudou a consolidar a matemática brasileira, diz Viana

Ao abrir o 33º Colóquio Brasileiro de Matemática (CBM), nesta segunda-feira (2), o diretor-geral do IMPA, Marcelo Viana, disse “não ser injusto” afirmar que a matemática brasileira foi construída em torno do evento. “Em particular no que diz respeito à produção da literatura matemática ‘made in Brazil’, já que boa parte dos grandes livros de matemática escritos por autores brasileiros como Jacob Palis, Elon Lages Lima e Manfredo do Carmo começaram como livros texto de cursos do colóquio”, pontuou. Realizado pelo IMPA tradicionalmente a cada dois anos desde 1957, o evento teve que se reinventar para a sua 33ª edição, que acontece em formato virtual até sexta-feira (6).

Se por um lado o formato remoto, necessário por conta da pandemia da Covid-19,  limita o contato entre participantes, por outro isso permitiu que ainda mais pessoas pudessem comparecer à mais abrangente reunião da comunidade matemática brasileira. Coordenadora-geral do evento, a pesquisadora do IMPA Carolina Araujo ressaltou que o evento atingiu 2.440 inscritos, número consideravelmente superior às edições realizadas presencialmente. “É um tempo de muitos desafios para a sociedade, para a ciência e inclusive para a matemática. Gostaria de dar as boas-vindas a todos e agradecer a equipe, aos organizadores das sessões e professores e monitores que estão dando os cursos”, afirmou.

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Para Viana, o evento está assinalando momentos importantes do instituto. “Um deles é a volta gradual das atividades presenciais do IMPA, que pretendemos fazer acontecer agora ao longo do mês de agosto, se as circunstâncias o permitirem e respeitando os protocolos de segurança”, frisou. Outro ponto citado pelo diretor-geral do instituto foi o aniversário de 40 anos da atual sede, no Jardim Botânico, ao mesmo tempo em que ocorre a construção do novo campus, adjacente ao atual, e que irá ampliar as contribuições do IMPA para a sociedade. “É um Colóquio do regresso a uma certa forma de normalidade pós-pandemia, e também um colóquio de comemoração e alegria em relação ao futuro do IMPA”, completou.

Além de parabenizar a coordenadora do evento, o diretor-adjunto do IMPA, Claudio Landim, aproveitou a ocasião para ressaltar a parceria com órgão público de pesquisa francês Centre national de la recherche scientifique (CNRS), que permite trazer pesquisadores da França para trabalhar em qualquer centro universitário brasileiro por longos períodos. “É uma oportunidade que não tem sido muito explorada por outras universidades. Estes pesquisadores têm vindo essencialmente ao IMPA. Convido a comunidade a aproveitar esta possibilidade e participar”, afirmou.

Paolo Piccione destacou a importância do encontro para a organização da qual é presidente, a Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), criada em 1969 durante uma das edições do evento. “Desde então participamos deste evento, e é durante eles que são apresentados os avanços da Sociedade e das novas diretorias”, comentou. Para ele, o colóquio reflete a diversidade da matemática brasileira. “A começar com as áreas da matemática representadas aqui. Além das tradicionais, como sistemas dinâmicos, geometria, topologia e álgebra; apresenta também estas áreas mais modernas como ciências de dados, aplicações à bioinformática, bioinformática, neurologia, machine learning. Uma programação riquíssima”, pontuou.

Martin Hairer falou sobre progressos em teoria euclidiana de Yang-Mills

Medalha Fields em 2014 e vencedor do Breakthrough Prize 2021, Martin Hairer (Imperial College de Londres) apresentou palestra sobre um problema ainda aberto em teoria euclidiana de Yang-Mills. Como ponto de partida para a discussão, o pesquisador austríaco apresentou uma definição da teoria quântica de campo euclidiana. “É a ideia de que você tenta construir teoria quântica de campo fazendo o tempo imaginário”, pontuou.

Hairer falou sobre soluções para o problema da invariância de Gauge encontrados por pesquisadores nas últimas décadas, como o “Abelian Yang-Mills”. “​É enorme a quantidade de matemática que vem sendo produzida/descoberta de 1900 para cá”, comentou o participante Stanley Carvalho, no chat do vídeo da apresentação no YouTube.

Ao final da palestra, Hairer deu alguns conselhos para jovens matemáticos que desejam conhecer melhor o tema. “É um problema muito técnico, e por isso os artigos são muito longos, o que pode desencorajar algumas pessoas. Um bom ponto de partida é a leitura dos dois últimos capítulos do livro ‘A Course on Rough Paths’, que escrevi com Peter Friz. Eles não são muito técnicos, dão umas ideias sobre as provas mas sem entrar em todos os detalhes”, contou.

Shafi Goldwasser destacou desafios em machine learning: verificabilidade, robustez e privacidade 

A quantidade massiva de dados que produzimos na era da informação trouxe novos desafios para os profissionais da computação. Em palestra, a vencedora do Prêmio Turing Shafi Goldwasser (MIT & Simons Institute for the Theory of Computing) trouxe a sua perspectiva sobre como podemos desenvolver o aprendizado de máquina de forma mais segura, e mostrou os avanços recentes que têm sido desenvolvidos na área neste sentido.

“Pesquisas básicas em criptografia tiveram consequências em comércio eletrônico, criptomoeda, computação em nuvem e até mesmo em computação quântica. Por isso, hoje vou falar sobre aprendizado de máquina do ponto de vista de uma criptógrafa, e espero mostrar como métodos dessa área podem resolver alguns dos problemas do aprendizado de máquina”, comentou.

A pesquisadora, que define o aprendizado de máquina como a interseção entre estatística, inteligência artificial e teoria da ciência da computação, reforçou um ponto que considera relevante para a discussão. “Algoritmos de aprendizado de máquina aprendem e fazem previsões a partir de dados sem serem programados explicitamente, por meio da construção de uma hipótese ou modelo a partir de inputs de amostras.”

Ela acredita que o aumento na quantidade de dados disponíveis nas últimas décadas resultou em maior aplicabilidade da tecnologia em áreas como policiamento, segurança e concessão de crédito, o que suscitou um debate sobre as implicações da assertividade destas ferramentas. “Houve um deslocamento de poder. O que antes eram humanos decidindo, agora está sendo aconselhado por programas de computadores. E esse deslocamento de poder requer atenção”, frisou.  Para enfrentar estes novos tempos, ela destacou três aspectos aos quais profissionais da área devem se atentar durante a criação de modelos de machine learning: verificabilidade, robustez e privacidade.

As palestras desta segunda-feira (2) estão disponíveis no canal do Colóquio no YouTube. A programação do evento continua ao longo desta semana, com mais apresentações e cursos imperdíveis. Inscreva-se no canal para acompanhar!

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