Jorge Zubelli, um matemático multidisciplinar
Karine Rodrigues
Rodeado pelo verde da floresta e seus sons relaxantes, o IMPA convida à meditação. Que o diga Jorge P. Zubelli. Além dos 25 anos como pesquisador da casa, é contumaz na prática milenar, que o auxilia a manter o foco. Para quem ainda vê com estranheza um matemático que medita, faz ioga e é adepto do vegetarianismo, ele esclarece que isso é cada vez mais comum.
“Embora exista uma tendência dos cientistas de se mostrarem agnósticos e céticos, como que para preservar sua honra científica, muitos se interessam por atividades que tornam a vida mais equilibrada. É importante a ciência lidar com essa parte intuitiva, abrir essas portas”, avalia o carioca.
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Zubelli é assim: faz ciência com um olhar sem limites. Exercita o rigor e entende que a intuição também é relevante para se alcançar o conhecimento. Criado em um ambiente onde havia espaço para a Matemática e a arte, ele descobriu logo cedo que a interdisciplinaridade abre caminhos à solução dos problemas.
Pode-se dizer que o trabalho como pesquisador já se revelava na infância, durante as horas dedicadas ao exercício de montar e desmontar objetos. Repetia, de alguma forma, os passos do pai, engenheiro civil que, nas horas vagas do fim de semana, consertava carros.
“Peguei com ele essa mania. Meu avô falava que eu transformava um robô em dez”, recorda Zubelli, contando que a arte entrava em casa pelas mãos da mãe, professora da área. “Lá em casa havia um mix”, diz o pesquisador do IMPA, que tem irmãs engenheiras e arquitetas.
O primeiro contato com a Matemática, Zubelli credita ao pai. “Ele era extremamente estimulante em relação à ciência. Gostava de falar comigo sobre assuntos mais avançados. Eu ficava fascinado. Chamava a minha atenção o fato de que as operações matemáticas davam certo de formas diferentes.”
Na juventude, durante a graduação em Engenharia de Telecomunicações no IME, viu os computadores aumentarem de velocidade e de tamanho, recorda ele, que usava, no Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), uma máquina que, possivelmente, era, então, a melhor do Brasil.
“Você programava com cartão. Muitas vezes, o backup eram cartões perfurados que você guardava numa caixa, numerados. Se você perdesse a ordem daqueles cartões, o programa ia para o espaço”.
Foi naquela época, final da década de 1970, que Zubelli soube do IMPA. Estava no primeiro ano do Instituto de Matemática do Exército (IME) quando um amigo, aluno do instituto, contou sobre os programas do IMPA. Fez o curso de Análise, depois outro e mais outro.
“Fiquei fascinado. O estrago já estava feito. Já havia sido contagiado pela beleza do negócio. Aí fiz todos os cursos possíveis e imaginários de Matemática Pura que havia no IMPA.”
No quinto ano da graduação, concluiu a tese de mestrado sobre mecânica quântica com o Rafael Iório, “um grande mentor e querido amigo”. Aplicou para o doutorado em U.C. Berkeley e New York University, nos Estados Unidos. Foi aprovado em ambas. Escolheu a Califórnia. Era 1984.
Na Califórnia, onde testemunhou um melting pot científico intelectual, aproveitou cada minuto para pesquisar, intensificou hábitos de vida mais naturais e percebeu claramente que não poderia tratar a Matemática separadamente das outras ciências. Fazia, então, pesquisa em sistemas integráveis, uma mistura de Análise, Geometria e Mecânica.
“[Isaac] Newton, por exemplo, além da Física e da Astronomia, estudou Matemática profundamente. O cálculo diferencial e integral num certo sentido tem uma contribuição dele fundamental. Por outro lado, era um cara extremamente místico, intuitivo. [Gottfried] Leibniz fazia ao mesmo tempo Filosofia e Matemática.”
A abertura para a interdisciplinaridade requer, diz Zubelli, o necessário diálogo com profissionais de outras áreas, em busca de uma linguagem comum. Ele vivenciou isso na Califórnia, nas pesquisas sobre áreas que envolviam outros profissionais, e também presenciou o início do intercâmbio com cientistas chineses e do bloco soviético.
“Acho que o caminho para a liderança e inovação científica é, de alguma forma, as pessoas conversarem entre si e serem capazes de participar de grupos interdisciplinares. À medida que a pessoa tem que ampliar os horizontes para colaboração entre diversas áreas, é mais necessária a capacidade de diálogo”, destaca o pesquisador do IMPA, admitindo que é algo desafiador, mas aumenta o impacto da ciência que se está fazendo.
Zubelli fez o pós-doc e aproveitou as oportunidades de trabalho nos Estados Unidos até que bateu a vontade de retornar ao Brasil. Fez concurso para o IMPA em 1994. Lá se vão 25 anos… Ao longo desse tempo, a trajetória como pesquisador tomou um rumo diferente: a perspectiva de trabalhar em Matemática abstrata foi aos poucos sendo substituída pela dedicação à Matemática aplicada, em áreas tão diversas quanto finanças, biomatemática e criminologia.
No Laboratório de Análise e Modelagem Computacional em Ciências Aplicadas (Lamca) do IMPA, que coordena, Zubelli usa ferramentas matemáticas poderosas para fazer a conexão entre os diferentes campos do conhecimento. Também passeia por várias áreas da Matemática, como álgebra, análise, geometria.
“É extremamente multidisciplinar. Estamos indo nessa direção”, diz o responsável pelo LAMCA, que, no momento, desenvolve um trabalho com um colega em Praga, na área de semicondutores.
Tão diversas quanto as áreas de estudos são os as nacionalidades dos alunos que orienta. “No momento, há dois colombianos, uma costa-riquenha, dois brasileiros”, diz, enfatizando que, nestes 25 anos de IMPA, se sente especialmente gratificado pelos alunos que orientou.
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