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23/01/2020

Alcides Carvalho defende tese sobre geometria diferencial

A dúvida sobre qual profissão seguir, atravessava a vida do matemático Alcides Carvalho. “Certeza nunca tive. Era muito de ‘onda’. Pensei em ser engenheiro mecatrônico. Sempre gostei da ideia de trabalhar com alguma engenharia. Morei por um tempo próximo a uma usina de cana-de-açúcar, em Alagoas, então planejei fazer engenharia química. Mas em alguns momentos também cogitava ser advogado.”

Apesar de ter as mais variadas opções em mente, havia uma certeza: a de que a vida poderia mudar a partir dos estudos. “Ainda na infância, quando morava no interior de Maceió, no município de Boca da Mata, estava com meu primo e falei ‘Heitor, vamos lá cortar cana e garantir um dinheiro.’ Depois de cinco minutos fazendo aquilo, disse a ele: ‘quer saber? Vamos embora que a gente ganha mais estudando.’ Desde então, comecei a estudar com mais vontade.” 

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A decisão rendeu bons resultados. Hoje, Heitor faz faculdade em Alagoas e Alcides está prestes a defender a tese de doutorado “Subvariedades Reais Kaehlerianas” nesta sexta-feira (24), às 13h30, na sala 228 do IMPA. No trabalho, Alcides explora problemas de rigidez de subvariedades, isto é, compreender se existe mais de uma única maneira de mergulhar isometricamente uma variedade no espaço Euclidiano. “Sou orientado pelo professor Luis Florit e pesquiso sobre geometria diferencial. Depois de fazer um curso com ele, descobri o que queria fazer. Resumidamente, o que estudo é se existe uma única maneira de colocar  determinado objeto de outro maior.”

Apesar de ser um novo objeto de pesquisa na trajetória acadêmica do matemático, a área de geometria sempre esteve presente. “Desde quando fiz iniciação científica, me identifiquei com assuntos geométricos. No mestrado, segui na área, mas estive mais focado nas teorias de calibre”, conta. 

Alcides nasceu em Fortaleza, mas se mudou nos primeiros anos de vida para Alagoas, quando os pais precisaram retornar à cidade natal. “Eles haviam se mudado em busca de emprego, mas não deu certo. Então, tivemos que voltar. Em 1997, quando meus pais se separaram, vivi por alguns anos com minha mãe, Maria, alternando nossa residência: morávamos por um ano em Maceió, onde vivíamos de aluguel, e outro ano em Boca da Mata, onde ela tem uma casa. Neste período, passei por colégios públicos e particulares.” 

Aos treze anos, Alcides perdeu o pai, mas seguiu com a inspiração matemática que ele deixara. “Não lembro muito bem com o que ele trabalhava exatamente, mas era ligado a cálculos. Na adolescência, passei a me interessar mais pelos estudos e peguei gosto pelos números. Mas não sabia que era possível fazer matemática na universidade.” Tanto que, na primeira vez que prestou vestibular, o pesquisador se inscreveu para cursar engenharia da computação. “Acabei não sendo aprovado. Quando tentei novamente entrar para a Universidade Federal de Alagoas, optei pelo curso de matemática”, conta com alegria. 

“Entrei para licenciatura e, logo nos primeiros semestres, vi que não era bem aquilo que eu queria. Mudei para o bacharelado, depois de conversar com amigos e professores. Foi quando me encontrei!” Já na graduação, Alcides começou a participar de eventos acadêmicos. “Pela primeira vez, saí da UFAL para participar de uma jornada de iniciação científica. Vim ao IMPA acompanhado de amigos: dois deles deram um seminário e eu apresentei um pôster. No ano seguinte, em 2013, voltei e participei do Programa de Verão”.

Ao concluir a faculdade, Alcides não pensou duas vezes: deu continuidade à formação acadêmica em um mestrado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). “Foi a primeira vez que morei sozinho. No começo senti falta de amigos e da família, mas com o tempo criei novos vínculos com pessoas de São Paulo. Criei novas amizades que, inclusive, estão vindo de lá para acompanhar a minha defesa.” 

Para tentar amenizar a saudade de Alagoas, o matemático contou com o apoio de uma importante aliada: a namorada Thays, quem conhecera na graduação, e chegou a ir para São Paulo, onde dividiram o primeiro apartamento juntos. “Ela ia e voltava de Maceió. Hoje, moramos juntos aqui no Rio de Janeiro. Thays faz doutorado em Educação Matemática, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).” Empolgado, Alcides já se prepara para os próximos passos da pesquisa: “estou aplicando para pós-docs e espero poder seguir na carreira acadêmica.” 

O futuro doutor em matemática conserva hábitos rigorosos, mesmo quando não está fazendo pesquisa. “Às quartas-feiras, jogamos jogos de tabuleiro modernos no IMPA, sempre das 19h às 22h. Já às sextas, vamos à pelada dos alunos e professores.” Bem humorado, Alcides garante: “e jogo melhor do que o Gugu, mas não estou contando meus gols. O Gugu conta, mas ele também paga o churrasco, então está valendo!”

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