Navegar

26/11/2019

Para que servem e quanto ganham mestres e doutores

Foto: Freepik

Reprodução do blog do IMPA Ciência & Matemática, de O Globo, coordenado por Claudio Landim

Ricardo Takahashi, Professor Titular do departamento de Matemática da Universidade Federal de Minas Gerais.

Às vezes, ouvimos falar que uma pessoa tem “pós-graduação”. É relativamente comum, por exemplo, que os jornais ou a TV entrevistem pessoas que têm mestrado ou doutorado e que trabalham em alguma universidade ou centro de pesquisa, quando o tema da reportagem é relacionado com ciência ou tecnologia. No entanto, em nosso país, essas pessoas são relativamente raras, a ponto de uma grande parte dos brasileiros não conhecer pessoalmente ninguém assim. Dessa forma, o nosso imaginário a respeito de quem são e o que fazem os mestres e doutores no Brasil – nossos “cientistas” – termina por deixar de captar um quadro com aspectos interessantes, que tem algo a dizer inclusive sobre o nosso futuro como país.

É preciso primeiro dizer o que são mestres e doutores. Quando uma pessoa obtém um diploma de graduação de qualquer curso, normalmente significa que adquiriu conhecimento sobre os princípios básicos do campo de conhecimento desse curso e é capaz de resolver os problemas típicos da profissão. Um médico graduado, por exemplo, será capaz de diagnosticar as doenças mais comuns e de prescrever seu tratamento, enquanto um engenheiro mecânico graduado será capaz de saber como funcionam as máquinas mais comuns, como se deve instalá-las, operá-las, projetá-las.

Leia também: Claudio Landim ganha prêmio por contribuição à Educação
Premiação da OMERJ reúne mais de 300 pessoas no IMPA
Programa ‘Meninas Olímpicas do IMPA’ é destaque em O Globo

Já uma pessoa que faz um mestrado vai focar em uma sub-área mais restrita. O médico, por exemplo, poderá se especializar em dermatologia ou em cardiologia. O engenheiro mecânico poderá se especializar em sistemas térmicos ou em sistemas automotivos, dentre inúmeras opções. Ao cursar um mestrado, a pessoa se aprofunda em um tema e passa a compreender os limites do conhecimento existente sobre aquele assunto. Espera-se que um mestre seja capaz de compreender até onde as técnicas existentes funcionam e por que deixam de valer para tipos de problemas um pouco diferentes. Assim, um mestre é, em princípio, a pessoa capaz de utilizar adequadamente os limites do conhecimento existente na sua prática profissional. Empresas de tecnologia, centros médicos avançados, firmas de consultoria em negócios e tantas outras modalidades de atividades econômicas “baseadas em conhecimento” provavelmente não existirão sem um certo número de pessoas com mestrado atuando nelas.

Ao fazer doutorado, um profissional se diferencia de quem fez o mestrado porque, além de identificar as fronteiras de uma área do conhecimento, deve ainda ser capaz de identificar lacunas nesse conhecimento, aprendendo a preenchê-las. Em outras palavras, deve aprender a fazer pesquisa, gerando conhecimento novo. O médico, ao fazer um doutorado, irá, por exemplo, inventar um novo tipo de tratamento para uma doença para aumentar as chances de cura. O engenheiro mecânico vai criar um novo material para a construção de determinados tipos de peças, tornando-as mais leves ou mais resistentes. Essas são as chamadas “inovações tecnológicas”, cuja presença ou ausência na atividade econômica de um país basicamente explica por que é rico ou pobre.

Alguns estudantes que orientei no mestrado e no doutorado me contaram que quando disseram à família que continuariam estudando mesmo depois de obter o diploma de graduação, tiveram de responder à pergunta: “mas para quê isso”? Uma resposta plausível, que normalmente satisfazia os pais, era: “É preciso para poder ser professor universitário”. Mesmo no meio universitário, circulam várias opiniões sobre o que fazem as pessoas com pós-graduação em parte contraditórias entre si e em parte destituídas de fundamento. Costumo ouvir com certa frequência afirmações como as seguintes:

  • “As empresas no Brasil não contratam mestres nem doutores. Os únicos lugares para pessoas com pós-graduação trabalharem são as universidades.”

  • “Um título de mestrado ou doutorado diminui as chances de alguém obter emprego. Se você quiser se empregar na iniciativa privada, não faça pós-graduação.”

  • “As pessoas que fazem pós-graduação estudam muitos anos a mais para no final ganharem menos do que as que não fizeram.”

Vamos então aos dados. Utilizaremos aqui um estudo realizado em 2016 pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) [1]. No Brasil, tínhamos em 2010 um total de 516.983 pessoas que haviam estudado até obter o mestrado, e 109.953 que haviam obtido o doutorado. Esses números correspondiam a respectivamente 0,5% e 0,1% da população brasileira de 25 a 65 anos. Isso, sem dúvida, é muito pouco em comparação com os números de países como a França (10% e 1%, respectivamente), a Alemanha (12% e 1%) ou os Estados Unidos (11% e 2%).

Uma pergunta que um jovem normalmente faz ao avaliar quanto esforço e tempo investirá em sua formação é: vale a pena financeiramente? No caso brasileiro, ao contrário do que muitas pessoas imaginam, estudar vale muito: quem fez graduação recebe salários em média 170% maiores do que quem só completou o ensino médio completo. Já quem fez mestrado ganha, em média, remuneração 84% maior do que quem tem só graduação. E quem fez doutorado recebe, também em média, 35% a mais do que quem tem apenas mestrado. A remuneração média de um mestre, em 2014, era de R$ 9.719,00, enquanto a de um doutor era de R$13.861,00.

Mas onde, afinal, essas profissionais com mestrado e doutorado estão atuando? Será que estão apenas em universidades? Os dados do CGEE indicam que 27,6% dos mestres e 11,4% dos doutores trabalham no setor empresarial. Decerto parece pouco. Mas o que isso significa no que diz respeito à empregabilidade de pessoas com mestrado e doutorado?

Para tentar avaliar essa questão, temos dados indiretos que nos dizem alguma coisa. A Tabela 1 abaixo mostra os salários médios de mestres e doutores empregados em organizações de diferentes setores da economia em 2014.

Tabela 1: Salário médio de mestres e doutores em 2014 por setor da atividade econômica.

A Tabela 1, originalmente apresentada em [1], está apresentada aqui de maneira resumida, sendo omitidas várias linhas. Nessa tabela, os mestres e doutores empregados em universidades são contabilizados no setor “Educação”. Os salários neste setor, no entanto, são menores que a média dos salários de mestres e doutores. Pois bem, assumindo que os setores empresariais contratem profissionais na medida em que identifiquem a necessidade de seus serviços e que os salários sejam basicamente determinados pelo equilíbrio entre a escassez relativa desses profissionais e o valor gerado por sua presença na empresa, essa tabela parece indicar que muitas empresas dos setores listados necessitam de profissionais com essa formação. Caso não fossem necessários de maneira específica, ainda assim poderiam ser contratados, mas seu salário não seria diferente daquele de outro profissional apenas graduada.

Para ler o texto na íntegra acesse o site do jornal

Leia também: Com mais de 5 mil gols, Gugu é craque em campo e na OBM
Inscrições do Curso de Verão abrem em 16 de dezembro