Navegar

08/09/2022

Na Folha, Viana defende que a matemática 'deve muito ao café'

Crédito: Pexels

Reprodução da coluna de Marcelo Viana na Folha de S. Paulo

O matemático húngaro Alfréd Rényi (1921–1970) é autor de diversas descobertas importantes em temas da matemática discreta, como a teoria dos grafos, a combinatória e a teoria dos números. Ele escreveu uma vez: “Quando estou infeliz, faço matemática para ficar feliz. E quando estou feliz, faço matemática para continuar feliz”. Acho que muitos dos meus colegas se identificam com esses princípios.

A Rényi se deve também a importante descoberta de que “um matemático é um aparelho para transformar café em teoremas” —embora ela costume ser creditada a seu colega e compatriota Paul Erdös (1913–1996), outro grande consumidor de café e prolífico produtor de teoremas. A veracidade da lei de Rényi está validada, aliás, pelo testemunho dramático de ninguém menos que Henri Poincaré (1854–1912).

Leia mais: Da OBMEP ao Guinness, o livro dos recordes
Inscrições abertas para o PROFMAT até 3 de outubro
Prêmio IMPA de Jornalismo abre inscrições

No livro “Ciência e Método”, publicado em 1908, Poincaré descreve seu processo de descoberta matemática. “Durante 15 dias, lutei para provar que não podia existir nenhuma função como aquelas que desde então chamei de funções fuchsianas. Eu era muito ignorante. Todo dia, eu me sentava à mesa de trabalho e ali ficava uma ou duas horas. Tentava várias combinações, e não chegava a resultado algum.”

Mas uma noite tudo mudou. “No serão, contra o meu costume, tomei café preto e não consegui dormir. As ideias afluíam sem parar. Eu as sentia chocando entre si, até que pares se interligassem, digamos assim, para formarem combinações estáveis. Na manhã seguinte, eu tinha provado a existência de uma classe de funções fuchsianas. Só faltava redigir os resultados, o que tomou apenas algumas horas.”

Foi o ponto de partida de uma das maiores contribuições de Poincaré, a teoria das funções automorfas. Esta denominação foi proposta pelo matemático alemão Felix Klein (1849–1925). Poincaré chamava de funções fuchsianas, em homenagem a Lazarus Fuchs (1833–1902), quando o domínio é o disco, e de funções kleinianas, em homenagem a Klein, em todos os outros casos. Mas Klein achava que isso não fazia jus à importância de seu próprio trabalho no tema. Poincaré descartou com ironia a objeção do colega, citando o grande poema “Fausto”, de Goethe: “Name ist Schall und Rauch” (“nomes não passam de ruído e fumaça”, em alemão).

Leia também: ‘Ver cegos participarem igual a quem enxerga é satisfatório’
Crianças entre sete e 11 anos redescobrem a matemática