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06/08/2018

‘Em questões além da intuição, deixe a Matemática falar’

Qual a idade da terra? A diferença brutal entre os 4004 anos estimados no século 17 e os atuais 4,5 bilhões de anos pode exigir um tempo demasiadamente longo e conhecimento vasto para ser compreensível. Mas o premiado matemático francês Cédric Villani, palestrante desta segunda-feira (6) do Ciclo IMPA-Serrapilheira de Divulgação Matemática, conseguiu traduzir os intricados caminhos da ciência por meio de exemplos prosaicos.

Medalha Fields 2010, premiado por seus trabalhos em geometria, física matemática e equações parciais diferenciais, Villani já dirigiu o renomado Instituto Henri Poincaré, em Paris, e desde o ano passado, é deputado do parlamento francês, onde preside a Comissão de Ciência e Tecnologia.

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Ao apresentar Villani, o diretor do Instituto Serrapilheira, Hugo Aguilaniu destacou a importância da popularização da matemática e observou que Villani é o tipo de cientista que o órgão que dirige procura, por fazer divulgação científica por meio da vida pública e política.

Ao iniciar a palestra “Idade da terra: quando a Terra era demasiadamente jovem para Darwin”, o matemático chamou atenção para o fato de que, na vida real, os problemas científicos não se encaixam apenas em uma categoria ou outra. Observou ainda que os maiores cientistas do mundo podem estar completamente errados.

Na palestra de cerca de 1h30, Villani fez uma analogia entre partículas expostas ao calor e a plateia de estudantes, professores e congressistas para explicar o que teria sido o erro do físico e grande inventor britânico William Thomson (1824-1907), mais conhecido como Lorde Kelvin, ao calcular a idade da terra.

Para traçar uma estimativa, Lord Kelvin usou um método fundamentado na Teoria do Calor do matemático francês Jean Baptiste Joseph Fourier (1768-1830), que, na verdade, não está errada. Porém, o físico chegou a conclusões equivocadas ao pressupor que o interior da Terra seria sólido.

“Aqui está a imagem: vocês estão sentados em suas cadeiras como átomos em um sólido. Calor é como agitação. Imagine que a primeira fila começa a ficar muito agitada, indo para todas as direções, transmitindo a sua agitação para a próxima fila, depois para a próxima fila e assim por diante. É assim que o calor se comporta dentro do sólido. No líquido é muito diferente. As partículas não estão sentadas em seus lugares. Elas se movimentam pelo auditório. Se é uma partícula no líquido, você vai ficar agitado como os dançarinos na Cerimônia de Abertura do ICM, comunicando a sua agitação de forma muito mais eficiente. Isso é convecção, em oposição a difusão”, detalhou Villani.

O erro, na verdade, foi descoberto há muito tempo, 1895, por John Perry (1850-1920), assistente de Lorde Kelvin. “Ele sugeriu que o interior da terra, na verdade, seria líquido, não sólido”, acrescentou  Villani, observando que as equações matemáticas exibidas durante a palestra consideravam o calor no sólido.  “Ele encontrou a ordem de magnitude correta através de um raciocínio científico”.

Villani finalizou repetindo o alerta do início da palestra e destacou: “Lembram do que falei para você no começo da palestra? Quando se trata de questões que estão além de sua intuição, deixe a matemática falar”.

Professor Luis Felipe ao lado de dois de seus alunos na Francis Hime: Luana e Lucas

Professor de Matemática da Escola Municipal Francis Hime, em Jacarepaguá, Luis Felipe Lins levou uma turma do Ensino Médio para acompanhar a palestra. “Gostei. Foi muito didática”. Dois de seus alunos, Lucas Coelho, 16, e Luana Soroa, 16, também as falas de  Villani.

“Sempre soube que a Matemática está ligada a outras ciências. Pude reparar isso na palestra dele. Ele mostra como uma ciência a ajudou a outra para chegar ao cálculo da idade da Terra”. Luana completou: “Achei acessível. Muito interessante. Identifiquei nomes que já conhecíamos, como a termometria na Física.”