Decano do ICM passeia pela história da Física Matemática
Na primeira semana do Congresso Internacional de Matemáticos, ao final de todas as palestras, um senhor de quase 90 anos se dirigia ao palco para cumprimentar os painelistas e fazer-lhes perguntas muito aguçadas sobre sua pesquisa.
Seu crachá trazia apenas seu primeiro nome: “Michael”.
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Para os matemáticos, apenas isso basta. Para os outros curiosos, faltavam duas palavras: o sobrenome Atiyah, impresso na medalha Fields de 1966 e no prêmio Abel de 2004 (e vários outros no meio do caminho), e o título de Sir, entregue pela rainha da Inglaterra em 1983.
Na noite desta segunda-feira (6), foi a vez de Sir Michael Atiyah, o decano do ICM, ocupar o palco do anfiteatro do Riocentro para sua própria fala, na palestra Abel. O tema foi “O futuro da Física Matemática: novas ideias em garrafas velhas”.
“Você não precisa sempre usar ideias novas e sofisticadas; use ideias antigas, mas com um novo olhar”, disse. Auxiliado por uma tabela de símbolos projetada nos telões, mostrou como os conceitos fundamentais sempre voltam com novo vigor.
Durante uma hora, Sir Michael fez um passeio pela história da Matemática e da Física, começando por Arquimedes (“se não estiverem vendo Arquimedes na tela, ganhem uma medalha Fields e o rosto dele está lá”, brincou) e passando por um panteão de nomes influentes no desenvolvimento e aproximação dessas duas ciências, especialmente ao longo do século 20.
Segundo Sir Michael, a Matemática e a Física estiveram próximas ao longo de todas as suas existências. “Isaac Newton era um matemático ou um físico?”, perguntou ele, fundador e primeiro diretor do Isaac Newton Institute for Mathematical Sciences, em Cambridge, onde ambos estudaram e lecionaram com um intervalo de dois séculos e meio.
Pelo carrossel histórico da Física Matemática descrito por Sir Michael, desfilaram os grandes nomes da história do pensamento matemático.
Está lá Leonhardt Euler, autor daquela que ele considera a fórmula mais linda da matemática, a Identidade de Euler — que Atiyah compara à frase mais famosa da história da literatura, o “ser ou não ser” de Shakespeare.
Está lá o matemático norueguês Sophus Lie, criador dos Grupos de Lie mencionados em diversas palestras Fields (“uma das coisas mais importantes na matemática atual”) e proponente original da criação do prêmio Abel ainda em 1899, quando seu colega Niels Henrik Abel ainda estava vivo e se percebeu que o prêmio Nobel não tinha uma categoria voltada à Matemática.
Está lá John Von Neumann, que contribuiu em diversas áreas da Matemática e da Física. “Von Neumann era um gênio. As pessoas usam a palavra gênio de maneira muito casual, mas gênios mesmo são limitados: Mozart, Ramanujan”, disse Atiyah. “Ele fazia tudo, e fazia rápido”.
Está lá Bertrand Russell, único matemático a ter ganho um prêmio Nobel — no caso, o de Literatura. “Se você é um matemático e quer ganhar um Nobel, portanto, escreva bem”, aconselhou Sir Michael.
Também Kurt Gödel, “o mais famoso lógico do século 20”, passou pelo carrossel histórico de Atiyah. “Foi um louco formidável”, disse. “Ele demonstrou que há coisas que são verdadeiras ainda que não se possa prová-las.”
Segundo ele, o futuro da Matemática e a Física é a unificação de tudo, e essa unificação passa pela virada computacional iniciada por Alan Turing na Inglaterra dos tempos da Segunda Guerra Mundial, quando Sir Michael cursava o secundário em Alexandria, no Egito.
Ao final da palestra, enquanto a equipe que auxilia Sir Michael preparava sua saída, dezenas de membros da plateia se aproximaram em silêncio do palco. Quando ele saía, foi cercado por seus admiradores e respondeu a diversas questões, sempre com um sorriso no rosto.