Aloisio Araujo: 'Reformas são mais importantes que abertura'
Reprodução do Jornal O Globo
Entrevista de Cássia Almeida e Luciana Rodrigues
O economista Aloisio Araujo, professor da Escola Brasileira de Economia e Finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV) e do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), defende que o governo concentre agora seu capital político na reforma da Previdência, para reequilibrar as contas públicas, em vez de desperdiçar energia com outros pontos da agenda liberal do ministro da Economia, Paulo Guedes, como a abertura comercial do país. Após a Previdência, o caminho para ele deve ser a busca de outras reformas institucionais, como a tributária, como forma de melhorar o ambiente de negócios para estimular investimentos. Conselheiro de Guedes, que conheceu quando lecionava na Universidade de Chicago, Araujo elogia a desenvoltura política do ministro.
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Depois da reforma da Previdência, qual deve ser a prioridade do governo?
A mobilização do capital político é limitada. Acho certo vir primeiro a Previdência, que tem mais impacto fiscal. Mas depois do fiscal, sou muito favorável a virem as reformas institucionais. O México conseguiu estabilidade macroeconômica, mas com abertura econômica muito radical, com privatização plena. Abriu muito a economia com o Nafta (acordo de livre comércio entre EUA, Canadá e México), e o crescimento não foi tanto. Não que eu seja contra a abertura comercial, mas, na hora de usar o capital político, que é escasso, a reforma tributária é mais importante.
Mais importante do que a abertura comercial, um dos pontos da agenda liberal defendida pelo ministro Paulo Guedes?
O ambiente de negócios no Brasil está muito mal. Depois de tanto esforço com a Lei de Falências (Aloisio Araujo foi um dos autores, em 2005) , ainda estamos na média da América Latina. Na área tributária, nem se fala, estamos piores que todo mundo. De 196 países, somos o 190º (de acordo com relatório Doing Business, do Banco Mundial). A Índia fez reforma tributária, lei de falências e avançou não sei quantas posições. O sistema tributário brasileiro é uma confusão que atrapalha a vida das empresas e toda a economia. Outra reforma importante é a do Judiciário. Para acelerar os processos, inclusive para a Lei de Falências. Onde há vara especializada, o processo de recuperação é mais rápido, e a retomada do crédito é maior.
E se a reforma da Previdência não passar?
Acho que vai passar, mesmo desidratada. O presidente já entendeu que é importante. Vem falando sistematicamente. Paulo Guedes se mostrou um político muito bom. Acho que as chances de passar são muito boas. A maioria dos países tem idade mínima. É uma agenda brasileira, há melhores formas de usar esses recursos do que usar em aposentadorias precoces: fazer metrô, investir em educação infantil. Se a reforma não sair, a situação fiscal vai se deteriorar.
Reformas demandam muito capital político.
Por isso, eu acho que (o governo) tem de aproveitar o capital político para fazer a reforma da Previdência. Esse capital pode até crescer se o governo tiver êxito na economia. Ajuda ter a situação fiscal melhor para fazer a reforma tributária, porque todo mundo fica com medo de que vai vir aumento de carga. Pode fazer uma reforma tributária fatiada. Primeiro no Imposto de Renda. Muitos países estão tributando lucros e dividendos. A Índia conseguiu fazer, gente! Eles são 1,6 bilhão, e nós somos 200 milhões.
Por que o senhor menciona a Índia?
Era um sistema tributário muito mais complexo. Os caminhões ficavam numa fila entre um estado e outro por causa dos impostos estaduais. Teve impacto positivo. A Índia está crescendo mais que a China, e isso tem a ver com as reformas. As concessões (na área de infraestrutura) também são importantes, podem ajudar o crescimento. Gosto da privatização do saneamento, que envolve regulação federal bem feita. Isso pode trazer investimento a curto e médio prazos e aumentar o crescimento.
O senhor tem conversado com o ministro Paulo Guedes. Deu sugestões para a crise dos estados?
Falei com outras pessoas sobre minha visão. Temos que fazer um Proer (programa de ajuste no sistema bancário implantado no governo Fernando Henrique) para o saneamento. Quando houve o Proer, os bancos estaduais eram um horror: Banespa, Banerj. Uma má alocação dos recursos públicos infernal. Você incorporou esses bancos, e a maioria desapareceu, o que foi uma grande coisa. Pode dar um pouco mais de auxílio financeiro para os estados que privatizarem ou fizerem concessões na área de saneamento. Hoje gastamos muito com saneamento e somos ineficientes. É uma vergonha. Eu defendo fazer isso não para maximizar valor de venda, mas para ter subsídios cruzados, de cobertura, índice de universalização. Há doenças que estão voltando, isso piora a saúde e o desenvolvimento do capital humano.
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