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29/07/2018

'Queremos a matemática menos assustadora’, diz Viana, ao Globo

O
Globo apresenta neste domingo (29) entrevista de destaque com o diretor-geral do IMPA e presidente do Congresso Internacional de Matemáticos (ICM), Marcelo Viana, sobre o evento, que começa na próxima quarta-feira (1). Leia abaixo a matéria e a entrevista feita pelo repórter César Baima, de O GLOBO (Foto: Brenno Carvalho). 

Às vésperas de receber cerca de 3 mil matemáticos do mundo todo, entre eles alguns dos mais respeitados profissionais da área, Marcelo Viana, diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), está otimista. Principal evento do ramo, o quadrienal Congresso Internacional de Matemáticos, que começa nesta quarta-feira no Riocentro, representa a culminância de um trabalho de décadas da instituição e seus pesquisadores que fizeram do Impa um centro de excelência e referência global, mas também de um esforço pessoal de seis anos de Viana e colegas para trazê-lo pela primeira vez a um país do Hemisfério Sul.

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Quando o Brasil foi escolhido como sede do Congresso Internacional de Matemáticos, em 2014, o Impa tinha planos como uma expansão de seu campus na Zona Sul do Rio e iniciativas para receber profissionais de países em desenvolvimento. Como foi organizar o evento num contexto de cortes de recursos na ciência e na tecnologia no país?

Certamente foi um período complicado não só para organização do evento, mas para se fazer qualquer coisa, pois o Brasil vive uma situação complicada. Com o esforço que fizemos, a organização está bem encaminhada. Ainda temos algumas coisas para fazer, tudo dentro do prazo e no cronograma planejado. Acredito que estamos fazendo o melhor possível diante da situação e estou bastante otimista quanto aos resultados do congresso.

E quais são esses resultados esperados?

Além de reafirmar o compromisso, a excelência e o prestígio do Brasil na matemática, tem outro lado muito importante que é a popularização da matemática. Sempre tivemos a meta de fazer com que o congresso seja um marco histórico na matemática brasileira, uma influência positiva para torná-la mais popular e melhor falada no país. Nossa maluquice, no bom sentido, de querer fazer o congresso no Brasil foi usá-lo como pretexto para a matemática ficar menos assustadora para a sociedade brasileira como um todo.

Há alguma iniciativa especial neste sentido?

Estamos levando estudantes de ensino fundamental e médio para participar do congresso, com atividades próprias para eles. Além disso, a premiação da OBMEP (Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas) será dentro do congresso. Os garotos vão assistir à abertura no dia 1º, ver os ganhadores da Medalha Fields (o “Nobel da matemática”, concedida a cada quatro anos para profissionais com menos de 40 anos) em primeira mão e no dia seguinte, no mesmo local, vão receber as medalhas deles. É uma experiência que acho que não vão esquecer nunca.

Havia uma preocupação quanto à obtenção dos recursos para organizar o congresso diante dos cortes. O que se pediu foi liberado?

O
apoio do governo federal foi muito positivo. Não estamos nadando em abundância, não está sobrando nada, mas conseguimos assegurar todos os aspectos fundamentais do congresso. Um deles é o apoio ao comparecimento de matemáticos de países pobres e em desenvolvimento, no programa “Braços abertos”, uma das tradições do congresso e de responsabilidade do anfitrião. Oferecemos 630 bolsas para matemáticos da África, Europa do Leste, América Latina e Ásia-Pacífico e mais 250 para brasileiros.

Qual foi o investimento final?

O
orçamento final da organização de todo congresso ficou em um pouco menos de R$ 15 milhões, incluindo auxílios, aluguel do espaço e todas despesas obrigatórias da legislação, como saúde, seguros etc.

Você mencionou “garotos” quando falou dos vencedores da OBMEP. Assim como em outras áreas das ciências exatas, há uma grande lacuna de gêneros na matemática…

Infelizmente a lacuna é grande e não fecha. Todo ano admitimos duas dúzias de alunos. Nosso percentual de alunas admitidas é pequeno, em torno de 20% a 25%. Mas é assim principalmente porque temos poucas candidatas. No nível de pesquisador isso se acentua. É algo que nos preocupa e estamos procurando maneiras de preservar a excelência do instituto e melhorar a distribuição de gênero. É um problema geral, não só da matemática ou do Brasil.