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02/08/2018

Ghys encanta plateia com a matemática dos flocos de neve

Mal a palestra do francês Étienne Ghys inicia, surge no telão Lorde Cigano, de capa, cartola e voz tonitruante, garantindo realizar o maior de todos os desejos nos cafundós do Nordeste: nevar no sertão. Com a criatividade característica dos espetáculos mambembes, o personagem do filme “Bye, bye, Brasil” (1980) cumpre o prometido e faz cair sobre a plateia uma chuva de coco ralado e isopor.

Se no longa-metragem de Cacá Diegues a plateia ficou atônita, por razões diversas, professores e estudantes medalhistas da OBMEP (Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas) que lotaram um dos anfiteatros do Riocentro nesta quinta-feira (2) também saíram surpresos após ouvir Ghys discorrer sobre “a geometria dos flocos de neve”.

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Para começo de conversa, revelou o pesquisador, neva, sim, no Nordeste, no Rio e em muitos lugares que julgávamos impossíveis. Mas ela derrete muito antes de chegar ao solo.

O matemático abriu o Ciclo IMPA-Serrapilheira de popularização da Matemática, iniciativa que nasceu com o intuito de mostrar para o público não especializado o quanto o tema é instigante e se revela em situações cotidianas.

Pesquisador honorário do IMPA e ganhador do primeiro Clay Award Dissemination of Mathematical Knowledge, da Fundação Clay (USA), Ghys é um encantador de plateias. Interage e fala com tanta desenvoltura que, ao fim de cerca de 90 minutos de palestra, o microfone foi disputado. Ninguém ali se sentia intimidado em fazer perguntas ao diretor de pesquisas na École Normale Supérieure de Lyon (França) e pesquisador honorário do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), credenciais da Matemática de excelência que o move.

“Quem já olhou um floco de neve de perto?”, perguntou Étienne. Até os poucos braços que se ergueram na plateia, ao fim da palestra, descobriram fatos impensáveis sobre algo tão fugaz. Um floco, na verdade, é um hexágono. E existem na natureza 121 tipos deles. Mais, desde tempos imemoriais, tem despertado fascínio. Olaus Magnus, bispo que nasceu no século 15, fez um livro sobre o assunto.

O especialista explicou como os flocos de neve são formados, citando pesquisadores, como o físico e matemático Cliff Reiner, Janko Gravner e David Griffeath, que criou e definiu modelos matemáticos para os flocos de neve. Mais recentemente, Kenneth Libbrecht, do California Institute of Technology (EUA), há 15 anos desenvolve em laboratório diferentes modelos de flocos de neve.

O francês concluiu a palestra revelando um desejo: “Eu, Étienne, gostaria de ser o “mestre dos sonhos”, e das nuvens e da neve. Mas, infelizmente, não sou. Mas posso sonhar que um dia um medalhista neste auditório continue essa pesquisa. E esse sonho pode ser ainda mais bonito se for uma mulher.”

Três vezes medalhistas da OBMEP, Amanda Perez, 16 anos, estudante do Colégio Estadual Hugo Simas, em Londrina, Paraná, quem sabe, pode cumprir o desejo de Étienne.

“Achei a palestra interessante porque ele apresentou conceitos de Matemática, principalmente de geometria, e de física, outra área que sou apaixonada. Além disso, tratou de uma questão que está em aberto. Isso quer dizer que podemos vir a desenvolver pesquisas nessa área.”