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30/12/2021

‘Equacionei possibilidades para o futuro da filha de agricultores'

Dos 41 anos de vida, Paula Crocoli Sonza passou 23 anos em sala de aula. A professora de matemática de Farroupilha (RS) participou do Programa OBMEP na Escola de 2019 a 2021 e foi premiada três vezes pela olimpíada, por conta do desempenho de seus alunos. Filha de agricultores, Paula se descreve como uma pessoa tímida e afirma que tinha poucas oportunidades de continuar os estudos, mas a admiração que sempre teve pela figura do professor e o estímulo dos pais delineou sua escolha de profissão. 

“As escolhas e o futuro são incertos, mas como boa aluna de matemática, equacionei muitas possibilidades para o futuro daquela menina, filha de agricultores e com poucos recursos. Os anos foram passando e o meu amor por ensinar apenas aumentou. A timidez, em partes, ficou para trás. Hoje, me sinto privilegiada em ser professora, em ter lutado pelos meus sonhos e, acima de tudo, ser muito feliz com a profissão que escolhi”, afirma orgulhosamente.

O percurso até as salas de aula foi quase natural, porém com alguns percalços pelo caminho. Em 1998, Paula começou a graduação de matemática em uma faculdade particular, mas não tinha condições financeiras de manter os estudos. Foi então que decidiu começar a dar aulas, aos 18 anos, e assumiu uma turma de mais de 40 alunos. “Sempre gostei muito da matemática, mas quando eu comecei a dar aulas em uma escola estadual do Rio Grande do Sul não foi uma experiência fácil. Eu era muito nova, praticamente a mais jovem da sala entre vários alunos adultos, então foi extremamente desafiador”, relembra. 

A pouca idade não foi motivo para desânimo e, ao longo dos anos, Paula foi aprovada em concursos do Município de Farroupilha e do Estado do Rio Grande do Sul. Hoje, leciona na Escola Estadual de Ensino Fundamental José Fanton e na Escola Municipal de Ensino Fundamental Santa Cruz. 

Paula Sonza ao lado de medalhistas da Escola Municipal de Ensino Fundamental Santa Cruz

“Me considero uma professora com espírito olímpico, em busca de alunos olímpicos, que desprezam fronteiras e condições sociais. A motivação deve vir do seu interior! Não estou me referindo apenas aos alunos medalhistas da OBMEP, mas a todos os alunos criativos e motivados a descobrir coisas novas”, explica. 

O resultado do estímulo aos jovens é perceptível, e, nas escolas em que a professora dá aula, já foram alcançadas diversas metas. A Escola Santa Cruz ocupa o primeiro lugar nas séries finais de toda a região Sul, além da primeira posição nas séries iniciais do Rio Grande do Sul, de acordo com o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB). Já a Escola José Fanton é a segunda melhor escola entre os educandários estaduais nas séries finais do estado, ainda de acordo com a avaliação.

Mas Paula também atingiu conquistas pessoais. A professora foi premiada três vezes, na 11ª, 13ª e 15ª OBMEP e, em 2019, também começou a participar do Programa OBMEP na Escola, que contribui para a formação de professores em matemática com estudos aprofundados e novas práticas didáticas nas salas de aula. “Sempre fui muito apaixonada pelos desafios da OBMEP e falar com outros professores durante os encontros do programa é uma forma de incentivo para sermos ainda melhores do que já somos. De lá para cá, isso me impulsionou ainda mais a crescer como professora”, conta.

Sua participação no Programa OBMEP na Escola também rendeu a criação de um grupo de estudos focado na matemática olímpica, destinado a alunos que comparecem no contraturno escolar para ter aulas aprofundadas. “Eram alunos dos níveis 1 e 2 que iam aos encontros semanais, sempre muito interessados. A gente variava um pouco o conteúdo, mas o roteiro era baseado no que recebíamos pelo IMPA, porque o material disponibilizado é realmente muito bom”, diz.

A professora já comemorou diversas menções honrosas de seus alunos na olimpíada

Como professora de alunos do Ensino Fundamental, ela teve a chance de participar de várias edições da OBMEP e, desde 2012, todo ano comemora ao menos uma medalha ou várias menções honrosas entre os alunos que se classificam para a segunda fase. Em 2015, Paula teve a chance de ver seu um de seus alunos, o estudante Eduardo Toffolo, conquistar uma medalha de ouro e, já em 2017, foram duas de ouro e duas de bronze. Para a professora que vibra junto dos estudantes, as premiações da OBMEP são momentos muito felizes. 

“Está entre as três maiores emoções da minha vida. Eu sempre brinco que os momentos mais marcantes que vivi são o meu casamento, o nascimento da minha filha e as premiações dos meus alunos”, diz Paula, que recorda com clareza quando acompanhou alunos premiados no Rio de Janeiro na 13ª OBMEP, com suas famílias. 

“Eles eram filhos de agricultores e as mães nunca tinham viajado de avião, então foi algo incrível. Nas fotos, elas estão com os olhos inchados pelo choro! Na hora que abracei eles, lembro de pensar que eu não sabia se algum dia conseguiria outro feito como esse na vida. E aquilo significa muito! Sair de onde eles saíram e chegar naquele lugar não é fácil, mas é possível”, afirma, emocionada. 

Para o futuro, Paula vê ainda mais trabalho e, com isso, certamente avista novas conquistas. “Eu nunca fui uma aluna brilhante, mas sempre fui uma aluna com muita garra. A gente precisa ter vontade e não pode sonhar parado, precisamos ter uma atitude de transformação. Ter espírito olímpico é ter uma atitude corajosa e prazerosa! A missão do professor é construir uma base sólida para que algo possa ser construído sobre ela, independente das habilidades ou das escolhas de cada um. Precisamos valorizar os pequenos progressos diários, a alegria da superação e do comprometimento”, completa.