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16/05/2017

John Bush: 'O lagarto aperfeiçoa sua técnica há milhares de anos'

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Especialista em dinâmica de fluidos do MIT esteve no Rio a convite do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), onde participou do Festival da Matemática

 

POR ROBERTO MALTCHIK  –

 

“Nasci no Canadá, sou filho de uma inglesa e de um americano. Estive no Brasil pelo menos uma vez por ano, nos últimos dez anos. Gosto de estudar as coisas palpáveis, como a dinâmica de uma bola de futebol e as aplicações matemáticas na biologia, embora sejam fruto de problemas matemáticos bastante complexos.”

Conte algo que não sei.

A bola de futebol perfeitamente macia vai fazer a curva na direção errada. Você chuta para um lado e ela vai para o outro. Antigamente, as bolas tinham costuras porque era necessário. As costuras ajudavam a dar a curva esperada. Agora, você até pode produzir a bola super macia, mas, se o fizer, ela vai na direção errada.

Por que isso ocorre?

A rugosidade da superfície da bola é fundamental para definir a trajetória que ela vai percorrer no ar. Algo que imponha rugosidade, na escala de um milímetro, muda completamente a trajetória da bola no ar. Assim, a forma como o jogador bate nela influencia diretamente a curva que ela fará.

Uma pena que o jogador não possa sempre calcular com perfeição…

Pois é. Quando jogamos com uma bola lisa na praia vemos que ela toma direções erradas! Vemos as curvas e ficamos impressionados.

E como explica a direção do chute do Roberto Carlos?

Há duas grandes situações: primeiro, é a bola com efeito. Quando a bola está fazendo efeito, ela desvia o ar na direção oposta e provoca a curva desejada. Agora, tem a situação de quando a bola vai chapada, sem efeito. Neste caso, a pressão do ar muda o tempo inteiro e isso permite um comportamento errático e imprevisível da bola. É o efeito da turbulência, considerando a rugosidade dela.

Por que, na altitude, a bola é traiçoeira?

Porque a densidade do ar na Cidade do México é 10% menor do que aqui no nível do mar. Como a resistência do ar é menor, a bola chega antes. Com isso, lá, ela chega com um diâmetro de bola antes que aqui.

Como seria a bola perfeita?

Ela deveria ser leve o suficiente para que você obtivesse a curva desejada para as distâncias que você espera que ela percorra. Você pode fazer alterações, por exemplo, para uma bola de golfe ir mais longe, mas daí você também teria que mudar as dimensões do percurso.

Você também estuda como alguns animais conseguem caminhar sobre a água. Qual é a mágica?

Isto tem relação com o efeito da bola de futebol, só que a direção do fluxo vai para baixo. Insetos e animais grandes conseguem fazer isso. Como o lagarto, que joga o fluxo de água para baixo. É algo semelhante ao que faz um pássaro como o beija-flor. Os grandes animais forçam este fluxo continuamente de forma a sustentar o seu peso. Já os pequenos conseguem ficar parados sobre a água.

Se sabemos como um animal se mantém sobre a água, seria possível desenvolver um produto que permitisse ao homem fazer o mesmo?

As pessoas tentam reproduzir, mas teríamos que ser mais fortes. E deveríamos gerar dez vezes mais energia, com o dobro de velocidade, para imaginar esta possibilidade. Ainda assim, existe muita técnica envolvida. O lagarto, ao bater sobre a superfície, gera uma cavidade e a utiliza para fazer o movimento correto. Você pode até imaginar o homem caminhando sobre a água, em teoria, mas, na prática, o lagarto aperfeiçoa a própria técnica há milhares de anos. O homem mais rápido e com o maior pé do mundo não conseguiria repetir.

*Reprodução jornal O Globo

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