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07/06/2018

As pesquisas de intenção de voto: Matemática e realidade

Reprodução do blog do IMPA Ciência & Matemática, de O Globo, coordenado por Claudio Landim

 

Roberto Imbuzeiro Oliveira é pesquisador do IMPA

O ano de 1936 foi de eleição para presidente nos Estados Unidos. De um lado, o democrata Franklin Delano Roosevelt tentava se reeleger e continuar a luta contra a Grande Depressão. Do outro, o republicano Alfred Landon criticava o presidente pelas políticas do New Deal.

Duas tentativas de prever o resultado daquela eleição entraram para a história. Uma foi da revista “Literary Digest”. Ela fez uma enquete com mais de dois milhões de seus leitores. Mesmo assim, errou feio em seu palpite.

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A outra tentativa foi de uma empresa menor. Ela só entrevistou alguns milhares de indivíduos, mas concluiu corretamente que FDR ganharia a eleição de lavada. A companhia, que depois veio a se chamar Gallup, foi quem primeiro demonstrou o valor da metodologia científica nas pesquisas de intenção de voto.

Hoje, cada temporada eleitoral tem sua enxurrada de pesquisas. Acompanhar seus números virou parte das nossas vidas. Ao mesmo tempo, como tudo que envolve política, as pesquisas geram desconfianças. Será que os números servem para informar ou manipular? Nos Estados Unidos, a eleição recente de Donald Trump, que era tida como improvável, deu a sensação de que pode haver algo errado ou até desonesto na área.

Meu objetivo aqui não é investigar os institutos de pesquisa; isso eu deixo para os detetives de plantão. O que vou fazer é, em primeiro lugar, explicar o que há de Matemática nas pesquisas. Em segundo, veremos que as melhores pesquisas podem errar por uma série de razões. Por fim, falaremos do que pode ter dado errado nas pesquisas antes da eleição de Trump. Veremos que há, sim, motivos para apontar erros, mas também há muito o que admirar.

Primeiro, uma boa notícia. Por trás das pesquisas há uma Matemática tão sólida e consistente quanto a do Teorema de Pitágoras. O que é curioso é que essa Matemática nos diz coisas completamente seguras sobre probabilidades.

Para explicar isso melhor, comecemos pelo básico. Como você sabe, as pesquisas de intenção de voto nunca entrevistam todos os eleitores brasileiros. O que se faz é selecionar alguns indivíduos – uma amostra — e perguntar apenas a eles em quem pretendem votar.

Como pode a amostra representar bem o todo? A ideia chave é que, se escolhemos os entrevistados ao acaso, sem privilegiar ou preterir ninguém, então provavelmente veremos um retrato bastante fiel do eleitorado. Por exemplo, imagine que 50% dos eleitores pretende votar em branco. O eleitorado é muito grande e tem milhões de pessoas. No entanto, se entrevistarmos apenas 1.000 pessoas ao acaso, nossa amostra provavelmente terá entre 47% e 53% de pessoas votando em branco. Posso até garantir o seguinte: a chance de ver um número fora dessa faixa é de menos de 5%.

Você pode se perguntar de onde vêm esses números. É aqui que entra a Probabilidade, a área da Matemática que estuda o acaso. Com ela, podemos quantificar de forma muito precisa o erro provável de uma pesquisa eleitoral. Mais exatamente: se o estatístico quer dar um resultado que está certo com 95% de chance, ele usa a Probabilidade para calcular sua margem de erro.

Há muitas variantes do processo de selecionar amostras ao acaso. Às vezes é importante estratificar a população, isto é, dividi-la em grupos de acordo com renda, educação, e gênero. Com isso, é possível entender as opiniões dos diferentes grupos e (talvez) reduzir os erros da pesquisa em geral. De qualquer modo, a amostra dentro de cada grupo é sempre escolhida ao acaso. Esta ideia central chega a ser poética: para saber a opinião do povo, não fale com pessoas bem escolhidas (seus amigos, por exemplo). Apenas saia por aí, procure as pessoas e deixe falar qualquer um.

A Estatística compila, classifica e interpreta dados. A Probabilidade estuda o acaso como objeto matemático. Juntas, formam um casal formidável. No entanto, como qualquer casal, elas às vezes têm conversas difíceis.

Por mais que a Estatística queira, a Probabilidade não consegue garantir certeza nos resultados. De fato, toda pesquisa tem uma chance de errar para fora da “margem de erro”. Por exemplo, acima dissemos que o resultado estará dentro da margem com chance de 95%. Portanto, a chance de erro fora da margem é 5%, ou 1 em 20. Isso significa que, em média, a cada vinte pesquisas, uma terá erros maiores que a margem de erro! Isso é natural, inevitável e previsto com todo o rigor da Matemática.

Para ler o texto na íntegra acesse o site do jornal 
 
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