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28/07/2020

Claudio Landim ‘ocupa’ blog de Guga Chacra no Globo

O diretor-adjunto do IMPA, Claudio Landim, publicou na sexta-feira (24) um artigo no blog do jornalista de política internacional Guga Chacra, no jornal O Globo. Escrito para a campanha #CientistaTrabalhando, o texto aborda a trajetória de Leo Szilard (1898-1964), físico húngaro que deu importantes contribuições ao desenvolvimento da bomba atômica. O matemático relembrou do fatídico encontro entre Szilard e Albert Einstein em 1939, que deu início ao projeto Manhattan, programa de pesquisa e desenvolvimento liderado pelos Estados Unidos que produziu as primeiras bombas atômicas durante a Segunda Guerra Mundial.

“Não foi fácil convencer o governo a adotar o projeto e todos conhecem o resto da história”, relembrou Landim. O diretor-adjunto do IMPA pontua que a carreira do físico húngaro transformou a percepção da ciência na sociedade. “Reconhecendo o papel dos cientistas na vitória na Segunda Guerra, os Estados Unidos alteraram profundamente o financiamento da pesquisa.”

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A campanha #CientistaTrabalhando é promovida pelo Instituto Serrapilheira em comemoração ao Dia Nacional da Ciência, 8 de julho. O objetivo é ocupar espaços de visibilidade na imprensa para falar sobre o processo científico e o tempo da ciência. 

Além de “ocupar”  a coluna de Guga Chacra, Landim participa da campanha com o blog Ciência & Matemática, que coordena no Globo. A física Marcia Barbosa e o biólogo Fábio Hepp já publicaram textos. E outros estão previstos para esta semana. 

Na Folha de S.Paulo, o diretor-geral do IMPA, Marcelo Viana, também participou da ação com a coluna “O valor da ciência” publicada em 8 de julho.

Confira o artigo de Claudio Landim publicado no blog do Guga Chacra na íntegra:

O papel da ciência: O fabuloso destino de Leo Szilard

No dia 2 de agosto de 1939, Leo Szilard, professor de Física da Universidade de Columbia, em Nova York, saiu de Harlem em direção a Long Island para visitar seu colega Albert Einstein. Esse encontro mudaria o destino das nações.

Szilard nascera em Budapeste, Hungria, em 1898, filho de uma família judia de classe média. Desde cedo, demonstrara interesse por ciência, ganhando, em 1916, o prêmio Eötvös, uma competição de matemática para alunos do último ano do ensino médio.

Os estudos e a gripe espanhola, que contraiu em setembro de 1918, o preservaram da Primeira Guerra. Em 1919, foi admitido no curso de física da Universidade de Humboldt de Berlim, onde teve aulas com Planck, Einstein e Nernst, três prêmios Nobel, defendendo, em 1922, uma tese sobre o demônio de Maxwell. Seus trabalhos seguintes deram origem à teoria da informação, ao microscópio eletrônico e ao cíclotron.

Embora tenha obtido a nacionalidade alemã em 1930, com a ascensão de Hitler à chancelaria, três anos depois, Szilard resolveu emigrar para a Inglaterra. Foi lá que concebeu a possibilidade de uma reação nuclear em cadeia, o princípio básico da bomba atômica. Registrou a ideia. A patente foi concedida em 1936 e mantida sob sigilo até 1949.

Já em Colúmbia, Szilard iniciou as primeiras experiências com diversos materiais para produzir uma reação nuclear em cadeia. Após vários fracassos, já alcançara resultados promissores quando voltamos ao encontro descrito no início dessa coluna.

Percebendo os possíveis desdobramentos do domínio dessa tecnologia e a par dos progressos de físicos alemães no assunto, em 2 de agosto de 1939, Szilard procurou Einstein, colega dos idos de Berlim e já famoso, para convencê-lo a escrever ao presidente Roosevelt e obter dele o apoio ao que viria a se tornar o projeto Manhattan.

Não foi fácil convencer o governo a adotar o projeto e todos conhecem o resto da história. Escrevendo essas linhas, não resisto à tentação de imaginar o que teria acontecido se o presidente dos Estados Unidos fosse Trump ou Bolsonaro.

Szilard teve ao longo da vida um engajamento constante. Na juventude, fundou na Hungria um partido socialista de oposição à União Soviética. Na Inglaterra, ajudou a criar uma associação de amparo a pesquisadores refugiados. Depois da guerra, tornou-se ardoroso defensor do desarmamento, participando da fundação da revista Bullettin of the Atomic Scientists, que entre outras coisas, coordena o famoso relógio do apocalipse [nunca, aliás, estivemos tão próximos do fim do mundo]. Sugeriu a Khrushchov a criação do telefone vermelho, linha direta entre os governos dos Estados Unidos e da União Soviética.

A carreira de Szilard transformou a percepção da ciência na sociedade. Reconhecendo o papel dos cientistas na vitória na Segunda Guerra, os Estados Unidos alteraram profundamente o financiamento da pesquisa. Se até então era patrocinada por universidades e associações filantrópicas, a partir do final da guerra, o Estado passou a ter um papel predominante. No Brasil, esse entendimento resultou na fundação do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) pelo Almirante Álvaro Alberto (será necessário lembrar que o orçamento do CNPq foi praticamente cortado pela metade de 2016 para cá?).

Atribui-se a prosperidade americana dos anos 50-70 ao investimento em ciência e tecnologia, financiado pelo orçamento das forças armadas, legado do projeto Manhattan e do governo Roosevelt.

Em defesa da pesquisa básica, vamos lembrar que os primeiros trabalhos sobre fissão nuclear foram puramente teóricos. Em 1933, em um artigo no jornal britânico The Times sobre os primeiros resultados no assunto, Lord Rutherford afirma que não há a menor esperança de uma aplicação prática (“qualquer um procurando uma fonte de energia na transformação de átomos estaria falando besteira” – anyone who looked for a source of power in the transformation of the atoms was talking moonshine”), mas que as experiências trouxeram novas luzes sobre os átomos.

Se o Brasil tem a pretensão de possuir submarinos atômicos, lançadores de satélites, vacinas, indústrias farmacêuticas, empresas de alta tecnologia, não pode continuar virando as costas a seus cientistas e à pesquisa básica.

Para o leitor interessado:

Richard Rhodes, “The Making of the Atomic Bomb”, Simon & Schuster 1986

William Lanouette com Bela Silrad, “Genius in the Shadows, A Biography of Leo Szilard, the Man Behind the Bomb”, Skyhorse Publishing, 2013

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