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30/07/2021

Belotto: ‘Escolhi a matemática acadêmica pelos desafios’

Crédito: Divulgação

Uma geodésica é uma curva que minimiza a distância, ou o custo, entre dois pontos. Mas o que acontece quando olhamos essa curva bem de perto? É essa a pergunta que o matemático André Belotto vai responder durante o 33º Colóquio Brasileiro de Matemática

Professor do Instituto de Matemática da Universidade de Aix-Marseille, na França, Belotto abrirá a programação do segundo dia do Colóquio, na terça-feira (03), com a palestra de divulgação “Sobre a regularidade das geodésicas em geometria sub-Riemanniana”. Nesta conversa com o IMPA, Belloto falou das suas motivações para escolher a matemática e como a pandemia afetou seu processo de pesquisa.

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IMPA: É a primeira vez que você participa do Colóquio como palestrante. Qual é a expectativa?
André Belloto: Eu estou muito contente e motivado com a oportunidade de fazer uma palestra de divulgação científica. De fato, eu nunca fui um palestrante, mas eu participei deste tipo de palestra quando eu era estudante de mestrado, e eu lembro o quão importante elas foram para mim. Eu gostaria de conseguir motivar os alunos e alunas a continuar a estudar matemática, ou ciência em geral, como aconteceu comigo.

IMPA: Você vai falar das geodésicas. Pode explicar brevemente a pesquisa que você apresentará?
AB: Estas curvas são de grande importância para aplicações em física, química, engenharia, ciência da computação, etc. A minha palestra é sobre o comportamento local destas curvas, ou seja, a forma delas quando as olhamos bem de perto, entre dois pontos bem próximos. Neste caso, a situação é especialmente interessante quando existem certas restrições físicas. Por exemplo, imagine que você esteja em uma vaga de estacionamento, e que você queira ir a vaga logo ao lado da forma mais curta, gastando a menor energia possível. Se você estiver a pé, basta andar em linha reta. Mas se você estiver em um carro, vai precisar manobrar, e o formato da curva que minimiza o trajeto do carro pode vir a ser bem complicado. Durante a minha palestra eu vou considerar geodésicas sobre restrições que provêm do que chamamos de geometria sub-Riemanniana, um tópico com uma imensa gama de aplicações, incluindo na robótica. Eu vou contar como o estudo deste problema utiliza uma grande quantidade de diferentes técnicas clássicas da teoria de singularidades, geometria algébrica, teoria da medida, entre outras. São aplicações de técnicas que foram desenvolvidas há mais de cem anos, por pessoas que provavelmente não imaginavam que poderiam ter consequências em áreas como a robótica.

IMPA: É também a primeira vez que o Colóquio ocorre em um modelo virtual, por conta da pandemia. Como foi a sua produção nesse período? Diminuiu, aumentou? Como você acha que a pandemia afetou os pesquisadores?
AB: A minha produção científica flutuou durante o período, e eu acredito que isto aconteceu com muitos de meus colegas. Para fazer pesquisa eu acredito ser necessário criatividade e tempo. Durante a pandemia, eu acho que muita gente ficou ansiosa com toda a situação que vivemos, além de ter menos tempo para trabalhar por causa, por exemplo, de um aumento de trabalhos domésticos (como cuidar das crianças que não podem ir à escola). Pessoalmente, eu não sou criativo quando estou ansioso, e eu fiquei ansioso durante o ápice da pandemia. Desde que a situação se estabilizou na França, eu voltei a ver meus amigos e colegas, e a minha produção científica voltou a aumentar.

IMPA: Pela sua trajetória profissional, você deixou o Brasil e foi para a França. Quais são as diferenças entre os dois países em termos de pesquisa?
AB: Eu deixei o Brasil no fim do meu mestrado, e eu não tinha experiência ou clareza para formar uma imagem sobre a pesquisa no país. A minha imagem da pesquisa no Brasil se formou mais recentemente, quando eu me tornei um pesquisador mais maduro. O que eu me sinto confortável em dizer é que a qualidade humana presente no Brasil é imensa.

IMPA: O que te motivou a escolher a matemática?
AB: Aos dezessete anos, eu me sentia muito jovem para decidir o que eu queria fazer, e a matemática é um tópico flexível. A minha sensação era que, ao escolher o curso de matemática, o meu único engajamento profissional seria em fazer um trabalho intelectual, voltado à resolução de problemas, ao desafio. Isto se refletiu nas oportunidades que eu recebi durante o meu bacharelado, que incluíram a possibilidade de estágios na indústria. Estas oportunidades continuam a aparecer: há cerca de três anos, eu recebi uma proposta para trabalhar em um banco canadense como pesquisador. E, até hoje, eu sempre escolhi a matemática acadêmica por causa dos constantes desafios, da flexibilidade e da liberdade intelectual que ela proporciona.

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